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Prioridade.


Estou doente. Quem diria! Minha doença é grave e corro sério risco de vida, digo, de morte.
Puseram-me numa fila e não me deram prioridade, apesar de não aparentar, tenho bem mais de sessenta anos. Mas de onde eu seria se estivesse isenta das filas, afinal não sou canadense, européia ou qualquer outra coisa, sou brasileira. E como todo legítimo brasileiro também estou numa fila. As filas passaram a ser cartões postais do Brasil há anos e eu não poderia estar de fora. Mas não estou aqui para reclamar das filas. Quero falar de prioridade.
Estudam a minha doença já faz algum tempo e tenho certeza que se eu perguntar a qualquer um aqui sobre um tratamento eficaz, ou pelo menos algo que alivie os meus sintomas, todos saberiam de alguma receita. Mas você aí pode baixar o braço, vamos, baixe logo! Não me venha com mais uma receitinha caseira qualquer. Estou cansada de alimentar falsas esperanças, de pitaquinhos desacompanhados de ação, de soluções serem engavetadas todos os anos. Então trate logo de ficar quietinho e prestar mais atenção no que estou falando.
Meus sintomas pioram a cada ano, falta apoio às pesquisas, as verbas para tratar meus males desapareceram, faltam pessoas especializadas e capacitadas para cuidar de mim, começaram a faltar os remédios, meu corpo dói todo da ponta do dedo até o último fio de cabelo. Não estou reclamando e até agradeço por ainda ter cabelo, pois não sei até quando eles continuarão grudados ao meu couro cabeludo. Hoje, tenho problema cardíaco, pulmonar, ócio... tenho faringite, labinritite, sinusite, esofagite e outros milhões de “INTES” precisando de tratamentos urgentes, fora os cânceres que se multiplicam diariamente e não se tem equipamentos suficientes para tratá-los. Meu problema é generalizado!
Todo dia surge uma doença nova e ninguém consegue se preparar direito nem para as que já existiam. Estou precisando de cuidados. É dengue, AIDS, malária, gripe aviária, gripe suína, doença da vaca-louca e outros mil animais me deixando maluca diariamente.
Apesar de dizer em toda consulta que “encontrar a cura para a meu mal é prioridade” estou aqui esquecida no final da fila tentando permanecer em atividade na esperança de um dia poder ser assistida com dignidade e respeito, afinal muitos ainda dependem de mim. Não podemos continuar perdendo na fila outros sonhos, outras histórias, outras vidas... Tenho que ser tratada com prioridade. Mais ação, menos promessa!
Ah! Quase esqueço de me apresentar. Que falta de educação. Onde estou com a cabeça? Prazer, meu nome é Saúde.



Ps: Mais uma prosa nesse mar de versos. Essa não é nada poética, mas ta valendo!

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